O objetivo deste estudo é investigar a associação
da posição socioeconômica e comorbidades com o autorrelato da deficiência.
A variável resposta foi deficiência, definida a
partir do autorrelato de problemas nas funções ou nas estruturas do corpo.
A pior posição socioeconômica e a ocorrência de
doenças parecem contribuir para a ocorrência de deficiência.
Introdução
A temática sobre pessoas com deficiência tem
ganhado destaque em estudos na área da saúde pública e na política nacional,
ocasionado pelo grande interesse dos pesquisadores, pelo aumento da prevalência
de indivíduos com essa condição de saúde e pela precária condição
socioeconômica enfrentada pelas pessoas com deficiência quando comparados à
população em geral1-3.
A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), de 20151,
estimou a prevalência de deficiência, no Brasil, em 6,2%. Percentual inferior
ao apurado pelo censo de 20102, de 24%. Diferenças nos conceitos de deficiência
explicam a discrepância entre as prevalências divulgadas e a dificuldade de
comparação entre as pesquisas5.
Tem sido descrita de forma consistente uma associação
inversa entre nível de instrução da mãe e prevalência de deficiência; à medida
que diminui o nível de escolaridade materna, aumenta progressivamente a chance
de deficiência9,10. Mães com melhor nível de instrução têm mais facilidade de
prover os cuidados necessários aos seus filhos, maior renda, maior acesso à
informação, utilizam mais os serviços de saúde e estão menos expostas aos
fatores de riscos como consumo de álcool, uso de drogas e sedentarismo9
Estudos têm mostrado que indivíduos com deficiência
e com maiores privações socioeconômicas têm elevada prevalência de
comorbidades, menor acesso aos serviços de saúde e de reabilitação, o que
amplia as iniquidades em saúde11-18. Esses estudos já trazem algumas evidências
da relevância de políticas sociais focalizadas em populações com elevado nível
de vulnerabilidade, como é o caso dos portadores de deficiências.
Deficiência,
políticas sociais e pobreza
Políticas de bem-estar social, que visam o
desenvolvimento social a partir da redução da pobreza e da desigualdade, se
estabeleceram na agenda política dos países do hemisfério ocidental a partir do
início do século XX20-22. No Brasil, foi a partir dos anos 1930 que políticas
de bem -estar social começaram a ser implementadas. O caso mais marcante daquela
década foi a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que efetivou uma série de
benefícios de proteção do trabalhador no Brasil.
A partir da CF-88, o Brasil tem passado por um
importante processo de desenvolvimento social, com melhoria de indicadores de
saúde (em particular a queda da mortalidade infantil), de desigualdade e de
pobreza.
As mais importantes políticas sociais que surgiram
na década passada – como é o caso do Programa Bolsa Família (PBF) – são
focalizados por medidas de testes de meios baseadas fundamentalmente na renda
familiar per capita.
O BPC e as novas políticas de bem-estar social no
Brasil seguem justamente esse modelo de seletividade e focalização, buscando
ampliar os benefícios para os mais vulneráveis e, assim, eliminar a pobreza
extrema.
“Com efeito, o artigo 203 da CF 1988 estabelece a
proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à velhice e às
pessoas com deficiência, independentemente de contribuição à seguridade social.
(Costa et al.26)
O objetivo central deste estudo é, portanto, trazer
novos fundamentos empíricos, com base em análise estatística multivariada, para
demonstrar a associação entre pobreza e deficiência. Mais especificamente,
buscar-se-á avaliar se a baixa posição socioeconômica e maior frequência da
doença estão associadas à maior prevalência de autorrelato de deficiência entre
os indivíduos adultos e idosos, residente em um centro urbano.
Discussão
Este estudo mostrou que a baixa posição
socioeconômica representada pela renda familiar, escolaridade materna e do
entrevistado e a elevada frequência de doenças estão associadas à maior
prevalência de deficiência.
A prevalência de DEF estimada pela Organização
Mundial de Saúde (OMS)3, em 10%, foi semelhante à encontrada neste estudo. No entanto,
a Pesquisa Nacional de Saúde, em 2015, estimou prevalência de DEF em 6%, ao
passo que, o censo de 2010 em 24%. Como mencionado anteriormente, disparidades
encontradas entre prevalências de DEF podem ser atribuídas a vários fatores,
como: definições adotadas para o tema e variações nos instrumentos utilizados
para coleta5.
Kingston et al.40 comprovaram a teoria do acúmulo
de desvantagens ou riscos durante o curso de vida, afirmando que a pior
escolaridade contribui para o agravamento da condição de saúde entre idosos na
faixa etária de 85 a 90 anos com incapacidade funcional.
A pior condição socioeconômica e a elevada
frequência de autorrelato de doenças parecem contribuir para o aumento do
autorrelato de deficiência e favorecer as iniquidades em saúde nesse grupo
populacional. Com foco na redução dessas iniquidades, nossos dados apontam para
o incentivo de programas e políticas públicas com estímulo a práticas de
prevenção a doenças e agravos na saúde. Nossos resultados indicam a enorme
relevância da política de transferência de renda focalizada por meio da
aplicação de teste meio com base na renda familiar per capita e voltado a uma
população com elevado nível de vulnerabilidade, que é o caso dos portadores de
deficiência.
Referências
1. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE). Pesquisa nacional de saúde: 2013: ciclos de vida: Brasil e grandes
regiões. Rio de Janeiro: IBGE; 2015. 2. Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Censo demográfico 2010: características gerais da
popu-lação, religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE; 2012. 3.
Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Mundial sobre a deficiência.World
Report on Disability. São Paulo: SEDPcD; 2012.
Costa N, Marcelino M, Duarte C, Uhr D. Proteção
so-cial e pessoa com deficiência no Brasil. Cien Saude Co-let 2016;
21(10):3037-3047.
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